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Clima adverso leva à disparada das recuperações judiciais no campo

Dados da Serasa mostram que 207 produtores rurais entraram com pedidos de recuperação judicial no primeiro semestre, superando o número registrado em todo o ano passado, de 162

Foto do author Eduardo Laguna

As mudanças climáticas estão contribuindo para aumentar o número de empresas com dificuldades em honrar seus compromissos financeiros, sobretudo no campo, já que longos períodos de estiagem comprometeram a produção agrícola. Um balanço feito pela Serasa mostra que 207 produtores rurais entraram com pedidos de recuperação judicial no primeiro semestre, superando o número registrado em todo o ano passado, de 162.

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O levantamento considera produtores rurais que atuam com perfil jurídico. O crescimento dos casos de recuperação judicial é consequência da combinação de condições climáticas adversas, juros altos no crédito agrícola e aumento nos custos de produção.

“O atraso ou antecipação de uma colheita faz uma diferença gigantesca no agronegócio. Pode inviabilizar ou aumentar muito o custo de financiamento da safra. O clima prejudicou várias culturas, sendo, sim, um elemento importante para o crescimento expressivo das recuperações judiciais no agronegócio”, comenta o professor do Insper Fábio Astrauskas, CEO da consultoria Siegen.

Embora a maioria dos casos esteja no setor de serviços - 41% do total neste ano -, é no setor primário, onde se insere o agronegócio, que mais cresce o número de empresas que recorrem a recuperações judiciais. De janeiro a setembro, foram 287 pedidos, mais que o triplo dos nove meses de 2023: 77 casos.

Uma delas é a AgroGalaxy, uma das principais redes de varejo de insumos agrícolas do Brasil. A empresa fez o pedido em outubro, com uma dívida de R$ 3,7 bilhões e US$ 160 milhões. O valor inclui obrigações com instituições financeiras, produtores rurais e fornecedores, sendo a maior parte dos débitos classificada como créditos quirografários ― dívidas sem garantia real.

Uma das empresas agrícolas que está passando por recuperação judicial é a fornecedora de insumos AgroGalaxy Foto: Tiago Queiroz / Estadão

Economista da Coface para a América Latina, Patrícia Krause observa que, ao mesmo tempo em que os preços das commodities agrícolas caíram, os custos de produção seguem elevados. “A queda, por exemplo, nos preços de fertilizantes foi inferior a das commodities de grãos. As condições climáticas também não ajudaram muito. Então, fatores pontuais acabaram afetando o setor.”

Segundo Krause, os números mais recentes de recuperação judicial mostram que o pico de insolvência no Brasil não ficou no ano passado, como se esperava. Dados deste ano mostram que sete a cada dez pedidos de recuperação judicial no País são feitos por micro e pequenas empresas.

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Com a reforma da lei de falências e recuperação judicial, em vigor a partir de 2021, o processo se tornou mais acessível, o que também explica por que mais empresas estão recorrendo ao instrumento. “O fato é que o instrumento está ficando cada vez mais disseminado, até o agronegócio está usando, já que algumas varas da Justiça estão equiparando o produtor rural a uma pessoa jurídica para fins de recuperação judicial”, comenta o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi.

“Uma empresa negativada deve para oito credores em média. Não é tão simples, muitas vezes, sair dessa situação pagando à vista todo mundo, ou negociando um a um. Às vezes, é mais fácil mesmo para a empresa entrar com o processo de recuperação judicial na Justiça, porque aí o poder Judiciário chama todo mundo para um grande acordão”, acrescenta Rabi.

O ministério da Fazenda, no entanto, entende que há um desequilíbrio dos direitos de credores e devedores em processos de recuperação judicial. A solução se tornou mais aceita porque muito pouco é recuperado quando uma empresa entra em falência.

Na intenção de mudar esta lógica, um projeto de lei do Executivo está no Senado para que, quando a falência for decretada, os credores, ao invés de um juiz, tenham o direito de indicar o gestor da massa falida, o que permitirá negociar mais rapidamente os bens da empresa que quebrou. O objetivo, com a mudança na lei, é fazer com que devedores parem de oferecer planos de recuperação ruins, hoje muitas vezes aceitos pelos credores para evitar o risco de perdas maiores com a falência da empresa.

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